Foi também em um 20 de janeiro, como hoje, que Fernando Prass entrou em campo, pela primeira vez, como jogador do Palmeiras.
Há seis anos, o goleiro subia o túnel do Pacaembu para enfrentar o Bragantino, pelo Campeonato Paulista - o maior desafio, no entanto, começaria apenas em maio, quando o Alviverde estrearia pela Série B, contra o Atlético-GO, em Itu.
Fernando Prass, 40 anos, segue no clube, onde muita coisa mudou.
De quase falido, sem estádio para jogar e combalido tecnicamente, o Palmeiras se converteu em referência técnica e financeira no continente.
E Prass também mudou.
Se é verdade que já não tem a condição de titular absoluto, também é fato que sua representatividade para o palmeirense é hoje muito maior.
Evidentemente, as três conquistas nacionais (dois Brasileiros e uma Copa do Brasil) ajudaram nesse processo. Mas não foi só. Prass angaria iradores por sua postura e pelo enorme ligação afetiva que construiu com o Palmeiras.
Nesses seis anos, muitos momentos foram importantes. Prass, no entanto, tem o seu favorito.
"O momento mais especial foi a Copa do Brasil. Aquela final da Copa do Brasil”, disse ele, em referência ao torneio de 2015.
Em entrevista exclusiva à ESPN, cuja primeira parte você lê agora, Prass revelou os bastidores daquela partida e dos motivos que levaram um goleiro que jamais cobrara um pênalti antes a ficar responsável pela cobrança decisiva no jogo mais importante do clube em muito tempo.
"Se alguém tivesse que perder, que fosse eu", disse ele, que preferiu correr o risco a expôr os atletas mais jovens.
"E SE EU TIVER QUE BATER?" 6x5q4
Mas, afinal de contas, por que Fernando Prass colocou sua reputação em risco e resolveu bater um pênalti em plena final de Copa do Brasil? Ele mesmo revela.
“Começou (o ano) e teve Coritiba x Fortaleza na Copa do Brasil, que foi para os pênaltis. Aí teve Fluminense x Botafogo (no Campeonato Carioca) que também foi para os pênaltis. E os goleiros precisaram bater, mas não porque eles foram escolhidos"
"Começou a rodar (os jogadores), bateram 11, 12 e chegou a vez dos goleiros. Aí eu pensei: ‘Pô, e se amanhã tiver uma decisão por pênaltis e eu precisar bater? Nunca bati um pênalti na vida!’"
“É aquela coisa: goleiro treina muito para não usar. Você se prepara para tudo, mas para não usar. Eu pensei: ‘Melhor estar preparado do que não estar preparado’"
Com a chegada de Marcelo Oliveira, o Palmeiras adotou o hábito de treinar cobranças de pênaltis, mesmo sem que houvesse perspectiva de decisão.
"Mesmo durante o Campeonato Brasileiro, a gente treinava pênaltis todo dia. Todo mundo ia lá e batia uns três, quatro pênaltis”, conta.
PRESIDENTE PREVIU 1k5g1c
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Ao visitar um treino do time, numa tarde qualquer, Paulo Nobre, então presidente do Palmeiras, teve, então, uma espécie de visão do futuro.
“Como eu estava lá com os caras, comecei a bater (pênaltis) também. Comecei a bater, comecei a bater... Um dia eu estava lá no campo 2, na meia-lua, e lembro disso direitinho, do Paulo Nobre vindo e me falando: ‘Prass, tá batendo bem, hein! Vai decidir pra gente!’. Mas isso uns dois, três meses antes da (final da) Copa do Brasil”
“Fomos para a final e, chegando no vestiário o auxiliar do Marcelo me falou: ‘Prass, se tiver pênaltis, você bate?’. Falei: ‘Bato, sim, mas não vai precisar. A gente vai ganhar no tempo normal’. Foi para o jogo, 2 a 0 pra gente e eu pensei: ‘Bah, beleza, ganhamos’ (risos). Aí tomamos o gol e foi para os pênaltis"
"O Marcelo (Oliveira) perguntou pra mim: ‘Tu bate?’”
O normal, numa situação dessas, é que o batedor, se pouco habituado, fique em dúvida. Mas não Prass.
“Eu nunca tinha batido um pênalti na vida! Mas tinha (no time) o Vítor Hugo, que estava chegando, o Taylor, que estava na lateral direita, uma meninada no time. Eu pensei: ‘Pô, eu, como mais velho, tenho que assumir essa responsabilidade’. Porque se um desses meninos erra e a gente perde a Copa do Brasil, eu não ia me perdoar por não ter assumido a responsabilidade"
"Pensei: ‘Vou bater. Se tiver que errar, que seja eu’”.
'EU VOU FICAR NO MEIO' 35p6t
Mas não bastava bater, não. Tinha de caber a Prass nada menos que fazer a cobrança definitiva.
“O Alecsandro falou: ‘Prass, tu bate por último?’. Falei: ‘Bato, bato por último’, e pensei: ‘Bom, vou tentar pegar um (antes), né?’"
"E foi o que aconteceu! O do Gustavo Henrique eu defendi, o Marquinhos Gabriel errou, só que o Rafa (Marques) também errou e acabou indo pra quinta cobrança e eu tive que bater. Graças a Deus deu tudo certo (risos)”
E teve até "trash talk' com o goleiro Vanderlei, do Santos, antes da batida.
“(Antes da cobrança) O Vanderlei falou pra mim: ‘Prass, eu vou ficar no meio!’. Eu falei: ‘Ah, vai ficar no meio, é?’, e pensei: ‘Vou soltar o pé!’”
“Eu estava treinando com uma chuteira diferente (da usada no dia do jogo), e a trava era maior, porque (o campo do Allianz Parque) estava escorregando muito", recorda-se o goleiro.
"Tinha acontecido a decisão por pênaltis contra o Fluminense, e o Scarpa escorregou no pênalti que eu peguei. O Marquinhos Gabriel também tinha escorregado. E eu, como sou muito pesado e bato forte, meu pé de apoio também é perigoso escorregar. Então, eu até tirei um pouco de força e bati mais no jeito, para não ter perigo de escorregar. Se eu escorrego, a bola ia lá na arquibancada”
Do que aconteceu depois, nenhum palmeirense se esquece: Prass converteu a cobrança e saiu correndo em disparada para a linha lateral, na direção do setor leste do Allianz Parque.
O Palmeiras era o campeão da Copa do Brasil 2015.